Dia 31 de dezembro e eu estava ali, diante do espelho de uma pousada em Campos do Jordão-SP, me aprontando para ir até o restaurante onde iríamos comemorar a passagem para o Ano Novo.
Com 34 anos, eu jamais havia passado o Reveillon fora de Campinas. Minha família sempre foi do comércio e trabalhávamos ate tarde na véspera do dia primeiro.
Mas não esse ano. Minha vida havia mudado e então tive a oportunidade de viajar com minha esposa e os pais dela.
Os dias que passamos juntos foram ótimos, perfeitos, eu me sinto extremamente grato por essa oportunidade que Deus me proporcionou (e grato aos meus sogros que pagaram as diárias da pousada).
Como eu estava dizendo, eu estava ali, diante do espelho, parado, olhando minha imagem e com o pensamento distante quando minha esposa perguntou: "O que foi? O que você está pensando?"
Eu respondi: "É estranho, pela primeira vez eu estou longe de casa nessa data".
Ela quis saber se isso era ruim e eu expliquei que era bom, que já sabia como seria lá em casa, e rindo eu comecei a narrar exatamente tudo o que aconteceria (e aposto uma caixa de Fanta Uva que aconteceu) na festa na casa de meus pais.
Eu sabia quais pratos teriam, posso descrever até o gosto do lombo assado com batatas, quem levaria o arroz com passas, quem levaria a farofa e quem cuidaria das bebidas.
Minha cunhada estaria amarrando no pulso de todo mundo uma tal fitinha que é pra trazer sorte e se eu estivesse lá, pelo milésimo ano consecutivo, eu me recusaria a usar apesar da insistência dela, o que de certo modo me transformava no "chato", “diferente” da família.
Meu tio estaria tocando um sambinha no violão (o mesmo do ano passado, do retrasado...) enquanto alguém improvisava uma percussão com qualquer utensílio doméstico. Meu pai, numa mistura de constrangido e vaidoso, improvisaria um pequeno discurso e logo em seguida uma oração que faríamos de mãos dadas. Pouco tempo depois, alguém gritaria “Vai dar meia-noite!”, outro discordoria porque no relógio dele ainda faltariam 5 minutos e assim ficaria valendo a contagem regressiva da Rede Globo.
Ao dar meia noite, todos gritariam juntos “Feliz Ano Novooo”, se abraçariam, desejando um ótimo 2007. Para quem está solteiro é aquela história: "vamos ver se você engrena um namoro sério esse ano, heim?", para quem namora: "e aí? Sai casamento esse ano?" e finalmente para os casados: "esse ano vão encomendar um bebê, né?".
No meio dos abraços, uma das tias correria para frente da TV para ver a queima de fogos no Rio de Janeiro, minha mãe, as outras tias e agregados de pé ao lado dela fariam os comentários “Nossa! Que liiiiindo!" Nessa hora, se lá eu estivesse, eu sairia de fininho, iria até o quintal abraçar a Luma, minha boxer, desejar um feliz ano pra ela, como se ela soubesse o porque de tantos rojões, mas mesmo assim, ela retribuiria, rebolando e se retorcendo de tanta alegria pelo abraço recebido.
Depois de algumas horas (poucas), as pessoas já teriam comido, os mais velhos estariam tentando ir embora, porque já estariam com sono, enquanto os primos reclamariam que ainda é cedo demais.
Era realmente engraçado que mesmo longe eu soubesse como seria o Reveillon da minha família, que era praticamente o mesmo dos outros anos, a mesma rotina.
Quando terminei de falar, voltei a olhar pro espelho e de repente me deu um nó garganta, pois me toquei que, inevitavelmente, vai chegar um dia em eu vou sentir muita saudade de tudo isso.
Espero nesse dia, em que a saudade doer, estar com a consciência tranqüila que amei minha família com toda minha força, que não permiti que nenhum ressentimento, magoa, fizessem morada em mim, que soube perdoar quando algo me ofendeu e que tive a humildade de pedir desculpas quando entristeci os que me amam. Quero ter a certeza de que despejei meu coração naquele Pai-Nosso que meu pai puxou, quero lembrar que abracei meu irmão com sinceridade, que aprendi que essas pequenas coisas que hoje parecem sem importância são o que realmente importam, na mesma proporção que muitas vezes damos importância demais às bobagens, e que por tudo isso, vivi um feliz ano novo.
Na sua vida, no entanto, se está faltando o que é realmente essencial (perdão, amor, reconciliação) pra que sua casa tenha um Feliz Ano Novo, não perca tempo, mude isso agora. E quando assim for, então eu quero também desejar a você:
Feliz vida nova!
Rogério Feltrin (Rosa de Saron)
rogerio@rosadesaron.com.br